Eugene O’Neill é um dos mais célebres dramaturgos que os EUA produziu, parte de uma tríade – junto com Arthur Miller e Tennessee Williams – que conseguiu encapsular a identidade americana em personagens inesquecíveis. Ganhador do Nobel de Literatura, tendo tido quatro de suas 38 peças premiadas com o prêmio Pulitzer, Longa Jornada de Noite Adentro é a sua obra-prima. Transformada em filme por Sydney Lumet em 1962, a produção é estrelada pela única atriz até hoje a ser premiada com o Oscar 4 vezes: Katherine Hepburn.
Eugene O’Neill narra aqui apenas um dia, do amanhecer até meia-noite, na vida da família Tyrone, no que poderia facilmente ser chamada uma “longa jornada da Terra até o inferno”. Trata-se de um dia extremamente intenso em 1912, onde verdades e rancores secretos vêm à tona e confrontos dolorosos finalmente ocorrem, impulsionados por mágoas antigas. Os conflitos nos parecem ainda mais infernais quando aprendemos que são 100% autobiográficos: as revelações e problemas discutidos são todos dramas realmente vividos pelos pais e irmão de O’Neill.
A peça só foi encenada pela primeira vez depois da morte de toda a família O’Neill e os nomes são trocados: Mary Tyrone é a mãe, viciada em morfina desde o nascimento do filho mais novo; James Tyrone, o pai, sonhava em ser um ator sério shakesperiano, mas trocou essas aspirações por um papel onde poderia ganhar mais dinheiro; o filho mais velho, Jamie, foi praticamente forçado a também ser ator e torna-se alcoólatra; e Edmund, um retrato do próprio Eugene O’Neill, é um jovem que sonha escrever, mas é assombrado pela possibilidade de ter tuberculose, a mesma doença que matou o seu avô. São todos infelizes à sua maneira, havendo vivenciado dissabores diversos.
Com um teor tão dramático, em todos os sentidos da palavra, é, às vezes, até constrangedor transformar-se em testemunha de cenas tão íntimas. A vida familiar dos Tyrone é escancarada em momentos penosos e sempre verossímeis, até porque provavelmente não fogem muito do que acontecia de verdade na residência dos O’Neills. Um clássico que deve ser visto e revisto sempre, por nos fazer sentir, como poucos, e exigir que reexaminemos a nossa própria vida familiar.
Por Jonah Tash – jonahtash@cine61.com.br – Twitter: @jonahtashcinema
Long Day’s Journey Into Night (EUA, 1962) Dirigido por Sidney Lumet. Com Katharine Hepburn, Ralph Richardson, Jason Robards, Dean Stockwell, Jeanne Barr…